Total de visualizações de página

sábado, 27 de julho de 2013

OS CONTOS DE VICTOR HUGO


OS CONTOS DE VICTOR HUGO 
Nicéas Romeo Zanchett 
A BOA PULGA E O MAU REI 
                 O grande poeta francês Victor Hugo tinha um imensa afeição pelas crianças. Uma de suas obras mais notáveis foi "A arte de ser avô"; é uma prova de amor pela netinha Joanna, uma simpática menina, muito esperta, de quem o famoso avô era um humilde escravo. 
                  Em certa ocasião um senador contou que foi até sua casa para consultá-lo; chegando lá encontrou o poeta andando de quatro pelo quarto, servindo de cavalinho para os netos. O político estranhou, mas Victor foi logo dizendo: - "eu sou mesmo um escravo de meus netos." 
                  Sua neta Joanna sempre pedia que lhe contasse histórias. 
                  - Vovô, sente aqui e nos conte uma história. 
                  - É muito difícil inventar histórias, replicou o avô. 
                  - Não para ti, disse Joanna, acariciando-o. Escreves muitas histórias, mas quero que nos conte uma que ainda não esteja nos teus livros, avozinho. 
                  Os netos Jorge e Joanna sentaram-se aos pés do avô  e ele começou a narrar  o maravilhoso conto, "a boa pulga e o mau rei". 
                                                     A BOA PULGA E O MAU REI 
                   Era uma vez um rei muito mau que maltratava os seus súditos, mas estes não podiam destroná-lo porque possuía um grande exército para sua defesa. 
                   Todas as manhãs se levantava  com humor pior do que o da noite anterior, até que isso chegou aos ouvidos duma pulga muito amável e de muito bons sentimentos. Nem todas as pulgas são assim, mas aquela tinha sido muito bem educada; ela só mordia as pessoas quando tinha muita fome, e mesmo assim tinha todo o cuidado para não lhe fazer mal. 
                    "Vai ser difícil fazer este rei entrar no bom caminho", disse consigo mesma a pulga; "contudo, vou tentar". 
                    Naquela noite, quando o rei começou a conciliar tranquilamente o sono, sentiu qualquer coisa como uma picada de alfinete. 
                    - Oh! o que é isto? - gritou o rei. 
                    - Uma pulga que quer castigá-lo. 
                    - Uma pulga? Vamos ver. Espera um pouco. 
                     E levantando-se furioso da cama, o rei sacudiu lençóis e cobertores, mas não pode encontrar a pulga, pela simples razão que que ela havia se escondido na barba do monarca. 
                     Pensando tê-la afugentado, o rei tornou a deitar-se, mas tão logo deitou a cabeça no travesseiro, a pulga deu um salto e o mordeu de novo.
                     - Como se atreve a morder-me outra vez abominável inseto?, exclamou. Não tem mais do que o tamanho de um grão de areia e atacas o mais poderoso rei da terra? 
                     A pulga, sem se incomodar  sequer o respondeu e continuou a mordê-lo . Durante toda a noite não pode o rei fechar os olhos, e no dia seguinte levantou-se de péssimo humor. Mandou fazer uma limpeza extraordinária e vinte sábios, armados com potentíssimos microscópios, examinaram cuidadosamente o quarto e tudo o que nele entrava. Mas não acharam a pulga, porque ela tinha se escondido de baixo da dobra da roupa que o rei vestia. Naquela noite o monarca, precisando de descanso, deitou-se muito cedo. 
                     - O que é isso, gritou, ao sentir uma terrível picada.
                     - A pulga. 
                     - O que queres? 
                     - Que me obedeças e faças feliz o teu povo. 
                     - Onde estão os meus soldados? Onde estão os meus generais, os meus ministros? gritou o rei. 
                     Todos entraram rapidamente no aposento real. Fizeram a cama em pedaços, rasgaram o papel das paredes, arrancaram o piso, e, diante de tudo isto, a pulga estava muito bem escondidinha na cabeleira do rei. Dirigiu-se este para outro aposento, no qual tratou de dormir, mas a pulga deu outro salto, começou a mordê-lo e não o deixou descansar em  toda a noite. No dia seguinte o rei, furioso, fez publicar um edital contra as pulgas, no qual ordenava a seu povo que exterminasse a todas com a maior brevidade possível. Mas nem assim se livrou do pequenino inseto, que o perseguia incessantemente. O seu próprio corpo ficou manchado dos beliscões e pancadas que em si mesma dava nos esforços vãos que fazia para afastar a sua implacável inimiga. Depois de passar noites sem dormir, começou a ficar fraco e pálido, e com certeza teria morrido, se finalmente não tivesse decidido obedecer à pulga. 
                    - Entrego-me, disse em tom lastimoso o grande monarca, quando a pulga tornou a mordê-lo. 
                    - Farei tudo o que quiseres. Fala. 
                    - Deve fazer feliz o teu povo, disse a pulga. 
                    - Que hei de fazer para conseguir?, respondeu o rei. 
                    - Tens que abandonar imediatamente este país. 
                    - Posso levar comigo ao menos uma parte dos meus tesouros?
                    - Não!. exclamou a pulga. 
                    Mas, não querendo ser demasiadamente severa, a pulga permitiu ao malvado rei encher os bolso de ouro antes de se por a caminho. Então o povo constituiu-se em república, governou-se a si mesmo e chegou a ser feliz. 
                    Tanto Joanna como Jorge divertiram-se muito com este alegre conto, porque o vovozinho, imitando o implacável rei, atormentado pela boa pulga, revolvia-se e batia-se com tão cômicos movimentos  que as crianças quase morriam de rir. 
                     Satisfeito com o efeito produzido, Victor Hugo ensinou-lhes o maravilhoso conto que se segue.

                                                 O CÃO FIEL E O CRUEL MENINO
                     Era uma vez um cão muito bom, de cujo nome não consigo recordar-me; só sei que era um cão excelente, em toda a extensão da palavra; teria dado qualquer coisa para ser seu amigo. Por desgraça era muito feio e além disso quase nunca se lavava; mas a culpa era do dono, um mocinho rebelde que costumava maltratá-lo. 
                     Um dia, este perverso mocinho foi para aborda dum lago, bastante profundo, para fazer uma brincadeira que certamente conhecem. O mocinho tinha um punhado de pedras e atirava-as à superfície do lago, procurando que tocassem na água, saltando três ou quatro vezes. O cão estava sentado à distância, observando-o.  De repente o mocinho escorregou pela borda muscosa do lago e caiu na água. Já estava quase a afogar-se, quando o animal, saltando atras  dele, agarrou-o pela roupa e o salvou, conduzindo-o para terra. Mas aquele perverso, ficou zangado porque o cão, ao tirá-lo do lago, tinha lhe rasgado um pouco a roupa; em seguida atirou o cãozinho novamente à água em busca do seu chapéu, e enquanto ele nadava começou a atirar-lhe pedras, e por pouco não fez com que o pobre animal se afogasse. 
                     Um lobo faminto e feroz viu o que acabava de acontece, e, imaginando que o pobre cão ficaria alegre vendo-se livre dum dono tão mau e ingrato, aproximou-se, sem fazer barulho, do cão e murmurou-lhe o ouvido: 
                     - Deixa que eu vou devorá-lo.
                     Mas o cão fingiu ser surdo daquele ouvido, e o lobo, já cansado de falar, atirou-se ao mocinho. O fiel cão, porém, arremeteu-se contra o lobo, e depois de encarniçada luta, conseguiu afugentá-lo. Entretanto o mau dono tinha se escondido atras de uma árvore e armara-se com um pau. O bom animal correu para seu dono, alegríssimo  pela vitória, mas o mocinho, com voz irada, exclamou: 
                    - Para trás, bicho feio! Por que me amedrontaste lutando daquela maneira com aquele horrível animal? Bruto, brigão!
                    Mal acabou de dizer estas palavras, desatou a dar pauladas  no infeliz animal e acabou por expulsá-lo a pedradas. 
                    Mas o pobre cão continuou a seguir fielmente o seu malvado dono, que, sem nunca se cansar de cometer más ações, entrou num pomar para roubar maçãs. Bem sabia que o dono do pomar era um homem que não tinha contemplação alguma com ladrões; mas imaginava que naquela ocasião estaria o dono ausente, talvez no mercado.  Começou a apanhar maçãs e a atirar ao pobre cão as que encontrava verdes.  De repente apareceu o homem, e, desesperado, foi até ele armado com uma espingarda. Apontou-lhe com raiva, e disse-lhe: 
                   - Ou me paga imediatamente as maçãs ou disparo. 
                   O perverso mocinho não tinha nem uma miserável moeda nos bolsos. Vendo-se perdido, começou a gritar: 
                   - Cachorro, cachorro, venha até mim! 
                   Os cães não podem trepar em árvores, mas aquele podia. Saltou para o tronco como se fosse de borracha, e segurando-se aos ramos com os dentes conseguiu chegar ao pé do dono protegendo-o com o próprio corpo, precisamente no momento em que o dono do pomar disparava a arma. 
                    A bala penetrou o corpo do bravo e nobre animal. O pobrezinho voltou seus olhos moribundos para o mocinho, como implorando auxílio, mas este já ia muito longe, correndo como bom ladrão que era. E assim morreu o fiel cão, vitima de sua inquebrantável lealdade. 
                    - O que foi feito desse menino tão malvado? perguntou Joanna, nervosa de indignação ao ouvir contar os maus tratos que o cãozinho sofrera. 
                    - Continuou a ser mau, respondeu o avô, e pagou muito caro, porque ninguém nunca o estimou. 
.
Essas pequenas e geniais histórias que Victor Hugo contava a seus netos, mais tarde passaram a fazer parte das suas publicações, e assim chegaram até nós.
Nicéas Romeo Zanchett 
LEIA TAMBÉM >>> CONTOS E FÁBULAS DO ROMEO

2 comentários:

  1. Gostei muito do primeiro conto. Muito pertinente a momento em que vivemos no Brasil.
    Abraços
    Maria Esther

    ResponderExcluir
  2. Corrigindo : ... ao momento em que vivemos no Brasil.

    ResponderExcluir